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quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

A UM SER ESPECIAL

Somos todos especiais, disso ninguém duvida. Assim como também ninguém duvida que alguns são ainda mais especiais. 
Alguns parecem nascer mais especiais:
Ou nascem especialmente bonitos, ou especialmente ricos, ou especialmente doentes.
Outros nascem especialmente talentosos e compõem, ainda crianças, verdadeiras maravilhas, como Mozart. Outros tornam-se especiais a partir de suas dores pessoais, com Frida ou Clarice.
Outras - essas mais especiais ainda - tornam-se especiais por serem especialmente simples. Por serem belas, simplesmente, singelas. Por saberem, por simplesmente saberem viver. E, talvez por saberem viver, acabam por saber morrer, também. Ainda por esse motivo - tão especial - o saber viver, acabam, muitas vezes vivendo muito. E depois de muito viver - nem morrem - viram-se do lado e transformam-se em botão de flor ou numa reza a ser rezada aos domingos de manhãzinha. Ou ainda se transformam no que sempre foram: numa lembrança eternamente viva e especial do que é saber SER com simplicidade e com doçura. 
Assim foi esta linda brasileira que soube viver por mais de 105 anos com delicadeza e que nos deixou, sem coincidência, também em um dia muito especial - 25/12 - Viva Dona Canô - Viva Sempre!

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

2012 - O MUNDO NÃO ACABOU, MAS ENSINOU QUEM QUIS APRENDER:




Nunca mais quero minha casa cheia de gente. Agora eu a quero repleta. 
Repleta de amigo. 
E pra estar repleta, muitas vezes, basta um: um abraço de verdade, um sorriso franco, um olhar carinhoso, um colo e um desejo sincero de felicidade.









terça-feira, 18 de dezembro de 2012

OS LOUCOS E OS SANTOS




Deus me livre a mesmice de ser o mesmo uma semana inteira! Hoje sou o mesmo de hoje de manhã e é tudo que consigo manter. Daqui a pouco espero ser outro. O que amava há cinco minutos, quero odiar nos próximos cinco. E se eu não odiar, farei com que eu seja odiado. Mil vezes o mar agitado e o naufrágio que a calmaria - quero o terremoto, o vulcão. Fiquem os mesmos da semana passada sentados - aí - em suas varandas, em suas salas bem decoradas, assistindo à vida mudar - eu quero é estar lá mudando a vida.
Fiquem aí no eterno carrossel dos que não têm a coragem de enlouquecer, eu quero a montanha-russa da minha dor, da minha loucura. Se a roda gigante pelo menos girasse na velocidade da luz, talvez eu perdesse meu tempo em seu girar - mas lenta como ela vai - prefiro ser o alvo do tiro ao alvo: só o risco me faz gozar. O prazer bem comportado - este eu deixo para os que dizem que dois loucos juntos não se podem curar. E quem disse que eu quero me curar? Curar é virar isso que são os outros? Isso de vestir a mesma cara todo dia? Andar com os mesmos passos e falar o mesmo idioma a vida toda? Eu não! Deixem-me ser louco. Afinal, só os loucos e os santos é que sabem o prazer de ver os tolos - que se julgam normais - ajoelhados a seus pés a lhes adorar.
Na rodoviária, um louco me disse que era padre e que se tivesse um filho, ele teria meu nome: seu nome é bonito! Disse que estudou teologia, filosofia, advocacia, comunicação, que fazia filmes pornôs em São Paulo, que era alcoólatra e que queria terminar, comigo, uma cena no banheiro. Sorri como só os loucos sorriem. Ele reconheceu, então, que eu também era padre e que tinha feito filosofia, comunicação, advocacia e teologia - mas que os filmes pornôs estavam me esperando em São Paulo. Quando eu chegar, quero uma câmera em cada canto do meu quarto, uma luz bem forte e mil espelhos a me refletir - quero fazer amor comigo mesmo: e este será o mais pornográfico dos filmes jamais filmados.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

NA LOTAÇÃO





Quanto mais juntos os corpos, mais distantes as vidas
A lotação é uma cela em movimento
Com passageiros - condenados sem perdão –
Que pagam
                Com o próprio dinheiro
                Com o próprio quinhão
                A miséria da condenação

Caminhos mesmos com destinos e penas tão distintas
Cada um com seu ponto pra partir e pra chegar –
- cada qual com sua história – esbarrando no corpo do outro –
Empurrando pra fora do corpo do outro – a vontade do outro – de ser mais que só um outro.

                E agora? Parece que perdi meu ponto.
                A distância entre mim e o ponto que era pra ser o meu só faz aumentar, enquanto na lotação, os condenados se diminuem – se diluem – se desiludem.
                Todos perdidos de seus pontos. No fundo, estamos todos, assim,
Condenados a perder o nosso próprio ponto de descer.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

HUH?


Fico pensando - ainda bem que a minha cachorra não entende português. Imagina a confusão que ia ser.
Daniel vira e diz assim:

- Oh, o negócio tá lá dentro. Pra você fazer o negócio no negócio é no negócio lá de dentro, não é no negócio aqui de fora. NÃO É PRA FAZER O NEGÓCIO AQUI. O negócio é no negócio lá de dentro!

Agora imagina a cara da Catarina olhando pra ele e falando: "Huh?"

sábado, 8 de dezembro de 2012

SOFIA EM BOA COMPANHIA





- Anda, amor, o almoço está pronto!
- Já vou! Estou terminando de ler um texto. Já estou descendo. Pode começar a almoçar sem mim.
- Até parece! Não tem graça nenhuma almoçar sozinha. Fazer o almoço sozinha já é muito chato. Ainda bem que o Ney me faz companhia.
- Então, se você esta tão bem acompanhada, não precisa de mim.
- Ah, bobinho, não precisa ficar com ciúme do Ney. Eu amo ele, mas você é o homem da minha vida.
- Eu o amo, Sofia, ‘eu o amo’. Não é ‘eu amo ele’
- Ai, já sei. Você vem ou não?
- Já vou.
Até aquele sábado, eu não tinha descoberto se o que me irritava mais era o Ney Matogrosso o tempo todo – com ela cantando junto, sempre um tom acima ou abaixo; o eterno excesso de Sazon no arroz ou a necessidade de me interromper sempre no penúltimo parágrafo, dizendo ‘vamos almoçar, meu bem’ ou ‘o café está na mesa, amor’ ou ‘você não vai jantar?’ – será que a Sofia não faz mais nada além de comer?
Parece que ela adivinha o momento certo, o momento em que nada no mundo pode me interromper, exatamente, para me interromper.
Enfim, naquele dia eu descobri o que realmente me irrita nela. Eu desci as escadas, sem fome alguma e sem me lembrar do que acabara de ler. Sabia que, ao retornar ao escritório, teria de começar tudo de novo. Ao chegar à cozinha, lá estava ela, seu macarrão e o Ney Matogrosso - rouco de tanto cantar “a balada do louco” pela décima vez. Sentei e vi que ela estava com o facebook aberto. Enquanto ela me servia o suco, a amiga a chamou para o chat.
- Só um instante, Pedro.
(...)
- Ai, é a Paulinha. Eu a chamei para ir ao shopping comigo mais tarde. Eu quero comprar um vestido novo para a festa da Marieta. Espera...
(...)
(...)
Enquanto ela se servia, percebi que o Ney não estava gaguejando, na verdade o som é que estava no repeat. Servi meu macarrão, ao mesmo tempo em que ela terminava de encher meu copo com o suco.
- Eu não sabia dessa festa, Sofia. Quando é que vai ser?
- Quando? Vai ser ... ... Ai, espera um pouquinho
(...) (...)
- KKK  rsrs hehe kkk hskfhskfhekfhskhjls
- Ai, agora foi a Ju que me disse ‘oi’ e disse que quer ir com a gente ao shopping. Eu estou louca pra saber da separação da irmã dela.
- Sofia, francamente. Você me chamou pra almoçar com você ou com o Ney Matogrosso? Até mais!
-Volte aqui! A gente nem conversou! Você sabe que eu odeio almoçar sozinha! Aonde você vai, Pedro?
- Eu vou lá pra cima, meu amor. Vou almoçar no escritório. Não se preocupe, eu ligo o computador e abro meu facebook. Aí, quem sabe, a gente até converse. Tudo bem? Bj.


sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

DUAS VOZES





Enquanto eu esperava, sozinho, no corredor, ouvi duas vozes e um nome. Não conheci as vozes, mas o nome sim – Rosa.
Estavam falando da minha avó. Tentei parar de respirar para aumentar o silêncio e ouvir melhor o que eles diziam. Percebi que eram médicos e, depois disso, só percebi mais uma palavra: Câncer.
Desliguei.
No cemitério, ouvi, de novo, duas vozes. Estavam atrás de mim. Longe a ponto de pensarem que eu não as ouvia, mas perto a ponto estrondarem dentro de mim. Falavam meu nome, agora, e também o de minha avó.
De repente, pareceu-me que todos os outros tinham – cada um – escolhido uma cova e nela se escondido, porque o silêncio ficou maior que a morte e eu pude, então, ouvir com clareza o que as duas vozes despejavam.
As vozes pertenciam a duas velhas. E o assunto era eu, meu namorado que segurava minha mão em silêncio e o câncer que matou a minha avó. Ouvi quando uma disse que câncer é assim mesmo-é desilusão, desgosto, sofrimento.a pessoa cria seu próprio tumor.no caso da dona Rosa, o tumor dela é esse menino, esse desgosto.e ainda vem no enterro da avó com o outro do lado.deus me livre!coitada!
Pensei em desenterrar todos de suas covas confortáveis e gritar que minha avó adorava o Eduardo e que nós três passávamos horas ótimas ao redor da mesa, com seu café fresquinho, seu bolo de cenoura (o favorito do Eduardo) e que até viajamos juntos, uma vez, para o sítio dos pais dele. Ela estava tão linda e tão feliz. Dentro de um vestidinho cor de rosa com flores – ela era um jardim e os colibris até vinham beijá-la de tão linda! Mas eu não tive forças. Foi o Eduardo que cuidou de mim. E foi o Eduardo que respondeu por mim.
Eduardo escrevia. Sua resposta não foi para as duas velhas nem para as pessoas nas covas. Sua resposta foi para o mundo. Hoje encontrei o jornal onde ele publicou sua resposta.
Estranho! Faz tanto tempo e parece que foi ontem...

“Quanto tempo dura um câncer ideológico? No caso do que a deturpação do Cristianismo fez em relação à homossexualidade são quase dois mil anos. Ao redor de todo o mundo, homossexuais ainda são espancados e mortos – lutando pelo direito mais simples do mundo: o de viver suas próprias vidas. Direito este que até os insetos têm, desde que não encontrem pela frente uma besta chamada homem.
Quantas perdas!
Foram milhões de pessoas mortas nesses dois mil anos.
Quanto a humanidade perdeu! Desses milhões, quantos seriam grandes pintores, excelentes compositores, músicos maravilhosos, cientistas fabulosos (descobrindo curas para doenças, entendendo melhor nossa sociedade, nossa psique, nossas crianças, a nós mesmos). Quantos seriam excelentes médicos, advogados, engenheiros, políticos (honestos, inclusive). Quantos poetas! Quanto nós todos perdemos! Quantos comerciantes, empresários, artesãos! Quantos filósofos, historiadores, matemáticos! Quanto todos nós perdemos! Todos. E esses milhões morreram porque dentro de suas casas, de seus quartos, na intimidade de suas vidas, eles eram felizes com alguém do mesmo sexo – eis o seu grande crime – amar outro ser humano.
Milhões morreram em nome da bestialidade e da ignorância. Bestialidade de alguns que se julgam superiores porque, também, na intimidade de suas vidas, enfiam seus pênis em vaginas (e por isso são superiores). E ignorância de outros que passam a vida toda lendo o mesmo livro, também escrito há mais de dois mil anos e vão morrer sem entendê-lo.
Ao pensar em tudo isso, fica difícil não desenvolver um sentimento que nivelaria tudo e colocaria todo mundo na mesma corja: o sentimento de heterofobia. Ainda bem que sempre houve e sempre haverá uma maioria que, independente de sua orientação sexual e de sua religião, é suficientemente esclarecida para perceber que o que duas pessoas fazem dentro de suas vidas só diz respeito a elas duas e que a sexualidade de alguém é apenas um aspecto de sua pessoa e não a sua pessoa toda. Ser homossexual soma-se a ser brasileiro ou italiano, a ser homem ou mulher, alto ou baixo, médico ou carpinteiro, destro ou canhoto, inteligente ou fanático, melhor em exatas ou em humanas, branco ou negro, enfim, a inúmeras outras características físicas, psicológicas, sociais, geográficas, humanas, históricas que nos compõem a todos enquanto seres humanos.”
Eduardo, por amor ao meu Cristiano.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

A PAULISTA, A BOLSA E O BAIÃO






Trocava a bolsa de lado. Constantemente. Cruzava a alça sobre a camiseta um pouco mais curta que o convencional, depois descruzava pra cruzar novamente na próxima esquina.
Ia falando sozinho. Na verdade, ia escrevendo na mente o próximo diálogo. O último, segundo ele. Tinha saído do cinema antes do fim da sessão. Decidido a decidir tudo naquele dia. Seus passos traduziam na calçada larga da Paulista toda a sua decisão. Enquanto esperava o homenzinho no sinal ficar verde, roía as unhas bem feitas na tarde anterior. Na verdade, não roía as unhas, só a base – nem a base, roía - sim - a própria ansiedade.
Do outro lado da rua (e deste também, na verdade) o dia, acelerado como de costume na metrópole, ia se vestindo de noite. E ali, naquela região de São Paulo, a noite ganhava brilhos muito diferentes quando o sol se retirava. Bem maquiada, a noite invadia a calçada, as lojas e as pessoas. Agora todos tinham cores diferentes e mesmo os barulhos dos pés dentro dos sapatos eram outros. Enfim, esverdeou o homenzinho no farol e Luis atravessou a rua. Não estava só, embora estivesse absurdamente só. Seus passos rápidos acabaram por isolá-lo ainda mais dentro da sua solidão – as pessoas do lado de fora de sua vida iam ficando pra trás.
Não sei dizer se, voluntariamente ou não, seus quadris dançavam baião enquanto ele andava, sua bolsa continuava indecisa entre estar cruzada ou não. Como suas pernas quando esperava Paulo chegar no outro dia – na última conversa: acho que não dá mais;como assim?a gente já tentou de tudo, eu não confio mais em você.bobagem!bobagem, você só sabe dizer isso!não precisa alterar a voz!estou cansado de ser sempre quem altera a voz, estou cansado de te ver sempre assim bem comportado.chega! Era sempre com um ‘chega’ que a conversa chegava ao fim, aliás, que nunca chegava ao fim. Mas Luiz estava decidido a pôr, de vez, um ponto final nas reticências.
A larga avenida foi sendo deixada pra trás. O homenzinho no sinal ainda estava verde quando Luis pôs o último pé na calçada do outro lado e a bolsa resolveu enfim descruzar-se. O passo não era mais tão firme. Fora de Luis, uma brisa começava a assobiar. O ponto final de Luis não foi Luis quem pontuou. Ele não viu, ansioso em roer a ansiedade em suas unhas, mas nunca esteve só enquanto dançava seu baião no meio da Paulista. Sua bolsa era observada enquanto mudava indecisa de lá pra cá. Passos mais decididos que os seus o seguiam – cada vez mais perto – e tão perto chegaram que o alcançaram antes do chega de Paulo, antes de qualquer outro chega, antes do fim.
Deixaram Luis caído sem baião. A bolsa – indecisa – enfim decidiu-se: ficou ao lado do corpo. Ao lado do corpo que ninguém viu.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

A Niemeyer

104 anos, com certeza, é tempo demais para uma mente comum e é muito pouco para os gênios. Por isso, apesar da travessia dos séculos - como diz a personagem de "Um Copo de Cólera" de escritor Raduan Nassar, tivemos de Oscar Niemeyer, "o suficiente, mas não o bastante".